Avanços em adaptação e no balanço global são as principais expectativas da segunda semana da COP28
Após os anúncios dos primeiros dias de COP28, as negociações entram em sua reta final, com uma agenda de temas urgentes e que exigem tempo para debate e consenso entre os países, que precisarão avançar nos poucos dias que restam até o fim da conferência.
Hoje, (8/12), saiu mais um rascunho do Global Stocktake (GST), que, na avaliação da The Nature Conservancy (TNC) Brasil, embora traga opções sobre o phase out de combustíveis fósseis, opções de não incluir essa questão ainda estão na mesa e esperamos uma decisão nesta segunda semana de negociações. Até o momento, é mais provável que o texto final inclua uma linguagem não explícita ao termo phase out, mas sim aos compromissos dos países produtores e consumidores de combustíveis fósseis.
Apesar do texto do GST reconhecer os direitos de Povos Indígenas e demais comunidades tradicionais, o documento poderia enfatizar o papel de seus territórios como proteção climática e da biodiversidade e recomendar que países destinem e reconheçam essas áreas como estratégia para ampliar a ambição climática.
O GST é o documento mais aguardado dessa COP e a grande expectativa é que saia com recomendações para que as novas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs na sigla em inglês) estejam alinhadas à meta de manter o aquecimento global em até 1.5ºC e que considerem a Justiça Climática como um dos pilares de implementação.
O GST deve também ressaltar os Planos de Adaptação, incluindo a interface entre biodiversidade e clima. A COP28 é a primeira conferência internacional de clima após o anúncio do Novo Marco Global da Biodiversidade de Kunming-Montreal, e o texto é uma oportunidade para estabelecer uma conexão mais clara entre Natureza e Clima, trazendo para a discussão a relação entre as NDCs e as NBSAPs (sigla em inglês para Estratégias e Planos de Ação Nacionais de Biodiversidade), ponto importante na avaliação dos 10 anos do Acordo de Paris, durante a COP30, em Belém/PA em 2025, demonstrando avanços entre as duas agendas.
É esperada uma agenda de Adaptação robusta como resultado das negociações nesta COP28. Porém, durante a primeira semana de negociações foram poucos os avanços obtidos. Entre as expectativas está a definição dos mecanismos de implementação do Fundo de Adaptação, que até o momento atingiu apenas 56% da meta dos 300 milhões de dólares prometidos pelos países desenvolvidos. Identificar fontes de recursos alternativas complementares pode ser uma forma de acelerar a implementação do Fundo. Entre as alternativas estariam recursos gerados por meio da aplicação de parcela de 5% das receitas do mecanismo de mercado para reduções de emissões nos termos do Artigo 6. Na prática, o Fundo de Adaptação seguirá fortemente dependendo das contribuições dos países doadores.
A Meta Global de Adaptação (GGA), que deverá ser definida ainda nesta COP, permanece num impasse. Durante a primeira semana, os negociadores não conseguiram chegar a um acordo.
Para o Brasil, sair da COP28 com compromissos de Adaptação robustos é um dos principais objetivos do país. Contudo, a demora para que esse tema entre como prioridades das negociações preocupa. É fundamental que os países estejam mais preparados para respostas rápidas em cenários de impactos da crise climática, com avanços em relação à utilização de fundos financeiros e governança para acesso aos recursos.
Hoje, John Verdieck, diretor de política climática internacional de The Nature Conservancy, divulgou a seguinte declaração reagindo ao estado atual das negociações na COP28 em Dubai. “Na primeira semana da COP28 vimos vários comunicados importantes em muitas áreas críticas. No entanto, a questão mais importante de todas – a eliminação progressiva dos combustíveis fósseis e a transição para um futuro energético sustentável – ainda está por ser resolvida”.
Segundo ele, “as discussões continuam em torno da linguagem a ser escolhida – “phase out” ou “phase down”, “abated” ou “unabated”. As palavras são importantes, mas as ações fazem a diferença. Todos os comunicados e compromissos assumidos desde Paris em 2015 precisam agora ser implementados por países de todo o mundo para manter o compromisso de 1,5ºC”.
Primeira semana
A COP28 começou surpreendendo com o anúncio do Fundo de Perdas e Danos ainda no primeiro dia. Até o momento, as promessas de recursos dos países desenvolvidos chegam a 700 milhões dólares. Embora o acordo sobre o fundo seja histórico e positivo, o aporte inicial ainda é insuficiente. Segundo matéria publicada pelo The Guardian, os 700 milhões de dólares cobrem apenas 0,2% das perdas que os países em desenvolvimento sofrem enfrentando o aquecimento global anualmente. As estimativas do custo anual dos danos variam entre 100 bilhões e 580 bilhões de dólares. Além disso, os povos indígenas e as comunidades tradicionais destacaram que o fundo ainda não define como e se os recursos poderão ser acessados diretamente por eles
Outro tema que ganhou destaque na primeira semana da COP foram os sistemas alimentares e agricultura regenerativa. A presidência da COP28 anunciou que 134 líderes mundiais assinaram uma declaração histórica sobre agricultura, alimentação e ação climática. Com o objetivo de proporcionar apoio financeiro e técnico para ampliar e implementar medidas de adaptação e resiliência nos países para agricultores, pescadores e outros produtores de alimento, esse anúncio se soma aos esforços para ampliar resultados de restauração e conservação da natureza. Nesta segunda semana de Conferência, é esperada uma avaliação dessa declaração em plenária e a expectativa é que o tema seja incorporado nos debates principalmente das NDCs futuras, ou seja, tornar os sistemas alimentares parte dos compromissos climáticos dos países.
Brasil
O Brasil trouxe para a Conferência uma das maiores delegações desta COP e da história do país. São mais de 1.300 pessoas entre governos, empresas, instituições financeiras, universidades e representantes da sociedade civil. No âmbito do governo Federal, a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, falaram sobre a criação do Fundo Floresta Tropical para Sempre. Segundo a Ministra, a proposta brasileira não está fechada, mas o objetivo é captar 250 bilhões de dólares de fundos soberanos para financiar a conservação de florestas tropicais em 80 países, para além dos projetos de carbono. Um dos requisitos para acessar os recursos desse fundo seria o de manter taxas de desmatamento decrescentes.
“Esse fundo pode abrir novas portas para a captação de recursos, pois traz a oportunidade de negociar dívidas públicas em troca de compromissos de conservação. O Brasil segue com o objetivo de retomar o protagonismo na agenda ambiental, mas nesta COP, foi na contramão de seu discurso de ambição climática ao anunciar sua entrada na Opep+, merecendo ganhar o prêmio de fóssil do dia”, segundo a Diretora de Política Pública e Relações Governamentais da TNC Brasil, Karen Oliveira.
TNC Brasil
Em meio aos compromissos firmados na COP 28, em Dubai, se destaca o Decreto Executivo assinado pelo governador do Pará, Helder Barbalho, que institui o Programa de Integridade e Desenvolvimento da Pecuária do Pará. Este é o primeiro programa de rastreabilidade individual para bovinos com ênfase ambiental no Brasil, que busca aumentar a transparência na cadeia e combater o desmatamento. A TNC Brasil, que atua no Pará há mais de 20 anos, faz parte do grupo de trabalho que desempenhou papel fundamental na criação do Programa e continuará desempenhando papel fundamental na sua implementação, junto a outras 13 organizações.
Também apoiamos o projeto piloto de concessão de recuperação da vegetação nativa do Pará. Será o primeiro projeto de concessão de restauração no Brasil com um potencial grande de benefícios às comunidades do entorno e ao meio ambiente. O anúncio foi feito no lançamento do Plano de Recuperação da Vegetação Nativa, cuja meta é recuperar 5,6 milhões de hectares no estado até 2030. O primeiro edital do novo modelo será o da Unidade de Recuperação Triunfo do Xingu, uma área desmatada de 10 mil hectares no sudoeste do Pará.
A expectativa do Executivo é de que 2,7 milhões de toneladas de CO2 sejam sequestradas ao longo dos 40 anos de concessão. O investimento previsto é de R$ 220 milhões, com criação de dois mil empregos diretos, receita total estimada em R$ 400 milhões e retorno sobre capital investido em dez anos.
Outra iniciativa apresentada nesta COP foi o avanço do Plano de Bioeconomia do Pará (Planbio). Uma das principais novidades é que um dos eixos apontados no plano – o Inova Sociobio - vai ser transformado em política pública e virar um subprograma dentro do Planbio, se transformando assim em uma referência que pode dar escala à bioeconomia no estado.
Lançado em 2022, o "Inova Sociobio", desenvolvido pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará (Semas), em parceria com a The Nature Conservancy (TNC), programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) e Iniciativa Internacional de Clima e Floresta da Noruega (NICFI), já atendeu cerca de 30 comunidades, em seis municípios paraenses (Curralinho, Gurupá, Oeiras do Pará, Salvaterra, Moju e Belterra, com a implantação de seis pontos de inovação em bioeconomia nas regiões do Marajó, Baixo Amazonas e Tocantins. Ao todo 733 pessoas foram qualificadas, 92% dos beneficiários são pessoas pretas e indígenas, sendo a maioria de jovens mulheres