Terra ressecada no Cerrado Brasileiro
TERRA SECA Solo ressecado no Cerrado Brasileiro. © Denis Ferreira Netto/Concurso de Fotos TNC 2021

Artigos e Estudos

Top 10 do Clima

Palavras-chave para entender melhor a COP26

Por Karen Oliveira - Gerente de Políticas Públicas da TNC Brasil

A COP26 está chegando e junto com ela um conjunto de conceitos, termos técnicos, siglas e expressões que se espalham no nosso dia a dia. Muitas vezes somos surpreendidos por um familiar, amigo ou mesmo o colega do lado que nos pergunta o significado de uma sigla, de uma expressão climática e nós mesmos, que estamos no dia a dia envoltos nas discussões e nas negociações, temos dificuldade em expressar em poucas palavras o significado daquele termo.

Para ajudar todos a navegar tranquilamente por este importante evento, fiz um rápido levantamento entre os colegas da TNC perguntando qual palavra, expressão ou conceito sobre clima gostaria de ter uma explicação rápida. O resultado é este Top10+ de termos para entender melhor esta agenda. E se por acaso a sua palavra não estiver na lista, mande para nós.

1. O que é a COP?

Conferência das Partes Interessadas, que reúne anualmente 195 países mais a União Europeia, no âmbito da Convenção Quadro das Nações Unidas. Não importa se o objetivo da Convenção é falar sobre clima, biodiversidade, população e desenvolvimento ou o estado da mulher, por exemplo, a COP se refere a todas as partes interessadas (países) e ao processo de tomada de decisão de revisar e colocar em prática as diretrizes sobre um determinado tema, que, quando homologado pelo país, resulta em normas legais e políticas públicas.

2. Como surgiu a COP?

Surgiu a partir da The United Nations Framework Convention on Climate Change (UNFCCC, no inglês), ou Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (em português). A Conferência do Clima tem sua origem na Rio92 durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (ou ECO92). Naquela época, o Brasil tinha uma atitude proativa, de promover consensos e se empenhou em facilitar vários acordos. Globalmente, havia condições favoráveis para acordos multilaterais e para a cooperação internacional. Como resultado, a Conferência popularizou a ideia de desenvolver a economia incluindo as questões sociais e ambientais, batizando conceito de "desenvolvimento sustentável". A UNFCCC, ou simplesmente Convenção do Clima, estabeleceu como principal objetivo a estabilização das concentrações de gases de efeito estufa na atmosfera num prazo suficiente que levasse os ecossistemas a se adaptarem naturalmente à mudança do clima, assegurando condições para que o desenvolvimento econômico e social seguisse aumentando.  

3. O que é o IPCC?

Criado em 1988, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas é um órgão científico das Nações Unidas e da Organização Meteorológica Mundial. A partir de trabalhos científicos somados a análises técnicas e socioeconômicas, produz relatórios de avaliação com projeções sobre a crise climática. Em seu último relatório, o IPCC destacou cinco cenários, dependendo do nível de emissões que se alcance. No primeiro, em que a meta seria manter a atual situação, em que a temperatura global é, em média de 1,1 graus mais alta que no período pré-industrial (1850-1900), as medidas de mitigação até agora adotadas não são suficientes. Os cientistas preveem que, dessa forma, se alcançaria um aumento de 1,5 graus em 2040, de 2 graus em 2060 e de 2,7 em 2100, de acordo com o estudo divulgado recentemente. No cenário mais pessimista, no qual as emissões de dióxido de carbono e outros gases do efeito estufa duplicariam em meados do século, o aumento poderia alcançar níveis catastróficos, em torno dos 4 graus em 2100. Cada grau de aumento prenuncia cerca de sete por cento mais de precipitação em todo o mundo, o que pode originar um aumento de tempestades, inundações e outros desastres naturais.

4. O que foi o Protocolo de Kyoto?

É um acordo internacional, aprovado na COP3, em 1997, com o objetivo de reduzir as emissões de gases do efeito estufa, causadores do aquecimento global. Foi baseado nas “responsabilidades comuns, mas diferenciadas” (CBDR na sigla em inglês), em que os países que historicamente emitiram mais gases causadores do efeito estufa teriam maiores responsabilidades em pagar a conta gerada. Ele foi assinado por 175 países, porém ratificado por apenas 55, entre eles o Brasil. O Protocolo criou o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) que estabeleceu a possibilidade de reduzir as emissões desses gases nocivos à camada de ozônio de forma certificada, permitindo aos países negociar metas de redução de suas emissões gerando créditos de carbono ou a “Redução Certificada de Emissões” (CER, na sigla em inglês). Na prática, “países ricos” (desenvolvidos) comprariam dos “países pobres” (em desenvolvimento) créditos de carbono gerados a cada tonelada de carbono não liberada à atmosfera, alcançando metas de redução e assumindo o compromisso de transferência de inovação tecnológica e recursos financeiros para que os países pobres pudessem se desenvolver.

5. O que é o Acordo de Paris?

É um tratado internacional, e não apenas um acordo, como foi Kyoto, assinado por todos os países do mundo (ninguém ficou de fora desta vez), que se comprometem em adotar metas de redução que contribuam para o equilíbrio entre emissão e remoção de gases do efeito estufa até 2050. Este compromisso deveria resultar na adoção de medidas que permitam estabilizar o aquecimento global em 1,5ºC e levam os países signatários a assumirem metas de Contribuição Nacionalmente Determinadas (as tais NDC, na sigla em inglês), que registram a ambição climática de cada país com suas contribuições e compromissos. Note que aqui os países em desenvolvimento, como o Brasil, também têm metas a cumprir. O Acordo de Paris, estabelecido em 2015, nasceu bem amarrado e num contexto internacional muito mais forte e urgente de ações climáticas.

6. O que é adaptação e mitigação ao clima?

A mitigação é qualquer tipo de intervenção com o objetivo de evitar emissões de gases de efeito estufa ou retirá-los da atmosfera. O uso de energias renováveis é um exemplo, assim como projetos como Conservador da Mantiqueira e Cacau Floresta que estimulam a restauração com o plantio de árvores e soluções socioambientais e econômicas para a manutenção da floresta em pé. A adaptação são as ações implementadas para enfrentar os impactos já estabelecidos das mudanças climáticas. Na prática, mitigação e adaptação são dois lados da mesma moeda, se adaptação fosse um remédio, a mitigação seria a prevenção. 

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7. Qual a diferença entre crise climática  e emergência climática?

Crise climática é a expressão que vem sendo adotada para evidenciar a situação de emergência climática (ou mudanças climáticas) que estamos atravessando. A emergência climática ressignifica o conceito do aquecimento global pois, ao falarmos de emergência, estamos falando de um alto risco, num curto espaço de tempo.

8. O que é Litigância Climática?

A litigância climática se refere ao uso de instrumentos jurídicos para responsabilizar e incentivar o poder público, empresas e instituições financeiras a assumirem e se responsabilizarem por evitar, mitigar e compensar impactos gerados pelo cenário de emergência climática que estamos vivendo.

9. O que é justiça climática? 

É um termo usado para definir as mudanças climáticas também como uma questão ética e política, e não apenas uma questão de natureza puramente ambiental ou física. Os impactos das mudanças climáticas atingem de forma e intensidade diferentes grupos sociais distintos destacando que, cada vez mais, medidas de mitigação e adaptação devem priorizar as populações mais vulneráveis. 

Árvore na margem do Rio Jurua, no Acre.
ARVORE AMAZÔNICA Árvore na margem do Rio Jurua, no Acre. © Haroldo Palo Jr.

10. Como começar a entender o mercado de carbono?

Estes é um dos grandes desafios da COP26 e irá merecer uma discussão mais ampla numa próxima edição. Mas vou tentar explicar pelo menos o básico.

O Artigo 6 do Acordo de Paris trata dos resultados de mitigação internacionalmente transferidos (ITMO, na sigla em inglês), que é o conjunto de regras para permitir que os créditos de carbono sejam comercializados entre os diferentes interessados. O que vem sendo negociado nas conferências desde o estabelecimento do Acordo é justamente como serão feitas essas transações e a sua contabilização para o cumprimento de metas das NDCs. Assim, é necessário estar previsto no Livro de Regras uma espécie de manual, que contém diretrizes de como o Acordo de Paris funcionará na prática. Além disso, o  livro também explica como os países devem avaliar seu progresso, individual e coletivamente, para que possam readequar as NDCs a cada cinco anos até que as metas de longo prazo sejam cumpridas. Por isto há grande expectativa na sua conclusão durante a COP26.

Muitas vezes, quando falamos de mercado de carbono consideramos o que estava em vigor pelo Protocolo de Kyoto, quando o MDL avançou, mas acabou colapsando com a crise econômica pós-2008.  O que se discute agora é o funcionamento do mercado em um cenário em que os países em desenvolvimento também têm metas e um orçamento de carbono gerados no Mecanismo de Desenvolvimento Sustentável (MDS), criado no Artigo 6 e que possibilita o comércio livre de emissões, o chamado mercado voluntário, entre entes governamentais e não governamentais. Isto gerou uma fragmentação do mercado e explico melhor por quê.

Existem dois tipos de mercado. O regulado e o voluntário:

No mercado regulado os governos determinam esquemas fechados, envolvendo setores específicos, podendo precificar o carbono por meio da sua taxação. Assim, o governo especifica um preço a ser pago por tonelada de carbono emitida e os sistemas de comércio de emissões, chamados de ‘cap and trade’ ou ‘emissions trading system’ (ETS, na sigla em inglês), em que são vendidas permissões de emissões, operacionalizam esta transação. Pode haver também um sistema híbrido, que usa um modelo de taxação com sistemas de comércio. No Brasil, este modelo ainda não está em funcionamento, apesar de vários estudos realizados pelo Ministério da Economia, dentro do Projeto PMR Brasil, que vem analisando a inclusão da precificação de emissões via imposto e/ou mercado de carbono no pacote de instrumentos voltados à implementação da Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC).

Já o mercado voluntário está baseado em Reduções Voluntárias de Emissões (VERs em inglês), em que qualquer agente governamental, do setor privado ou da sociedade civil pode gerar ou comprar créditos de carbono voluntários. Esses créditos, também são auditados por uma entidade independente, mas, por enquanto, não estão sujeitos aos registros na NDC e, por isso, não valem como meta de redução para os países que fazem parte do Acordo de Paris.

Os preços do mercado de carbono voluntário são mais altos quando comparados ao regulado, dependendo da quantidade de oferta e percepção de “integridade” do carbono que está sendo negociado. Esses créditos podem vir de diferentes tipos de projetos que evitem ou reduzam as emissões de gases do efeito estufa, e, para garantir a integridade, devem ser todos certificados. A certificação envolve uma metodologia complexa e que tem sido revisada constantemente. A Verra é a plataforma de registro global, que garante que os créditos correspondem a menos carbono na atmosfera. Ela criou o Voluntary Carbon Standards (VCS), que é tido como uma referência, e o Gold Standard, considerado o de mais alto padrão.

Existem muitos detalhes neste processo de negociação sobre o mercado de carbono em especial para se evitar a dupla contagem entre as possibilidades geradas com a comercialização no mercado voluntário e no regulado. Apesar dos avanços alcançados até aqui, esta sem dúvida será uma das grandes decisões da COP26. Isso porque os créditos de carbono, a espinha dorsal dos mercados de carbono, podem, se combinados com outras estratégias, mitigar significativamente o impacto das emissões de gases de efeito estufa e fornecer importantes cobenefícios sociais, econômicos e de conservação.