Café Agroflorestal avança na Mata Atlântica e fortalece agricultura familiar
O café no Vale do Paraíba, em São Paulo, avança por novos caminhos, unindo produção agrícola sustentável e restauração ambiental. O projeto Café Agroflorestal, atualmente em sua terceira fase, surgiu para responder a um desafio global com soluções locais de combater as mudanças climáticas por meio de sistemas agroflorestais cafeeiros. No entanto, seus impactos vão além. Conduzido pelo Instituto Regenera em parceria com a The Nature Conservancy (TNC) Brasil, a iniciativa não apenas restaura paisagens degradadas, mas também garante inclusão produtiva às famílias agricultoras do território, com destaque para a participação das mulheres.
“Eu já produzia mudas de café, mas a chegada da irrigação, da caixa d’água e de todo o restante foi essencial para dar continuidade ao trabalho. Hoje, nosso café já começa a florir, mesmo na estiagem, porque conseguimos irrigar todas as áreas. Estamos muito felizes!”, conta Carmem Faria, proprietária do sítio Beija-Flora, do assentamento Olga Benário, em Tremembé (SP). Moradora da região há mais de 20 anos, Carmem não está sozinha nessa caminhada. Ao lado de Michelle e Roseli, ela integra um grupo de agricultoras que vem mostrando, na prática, como o café agroflorestal pode transformar vidas, restaurar paisagens e fortalecer comunidades.
As duas primeiras fases do projeto, iniciadas em 2023, focaram no mapeamento de propriedades da agricultura familiar interessadas em sistemas agroflorestais, na implantação das primeiras áreas demonstrativas e na capacitação dos agricultores. Ao todo, foram implantados 4,2 hectares de café em sistema agroflorestal e 0,9 hectare de adubação verde, distribuídos entre 12 propriedades localizadas em Lagoinha, Tremembé, Taubaté, São Luiz do Paraitinga, Santa Branca e São José dos Campos. As unidades demonstrativas passaram a funcionar como espaços de aprendizado e troca de experiências entre agricultores, técnicos e parceiros.
Outro eixo do projeto é a capacitação dos produtores, com formações voltadas para a cadeia produtiva do café e para práticas agrícolas mais sustentáveis. O objetivo foi preparar as famílias agricultoras para manejar os plantios de forma eficiente e ambientalmente responsável, ao mesmo tempo em que se fortalece a inclusão produtiva no território. “Com o piloto, conseguimos mostrar que é possível restaurar paisagens e, ao mesmo tempo, gerar renda. Nosso próximo passo é consolidar esse grupo de produtores para que alcancem escala e sustentabilidade econômica”, ressalta Marina Campos, especialista em conservação da TNC Brasil.
O conjunto de ações realizadas nas fases iniciais garantiu não apenas a implantação de áreas estratégicas de produção e restauração, mas também lançou as bases para que os agricultores se tornem protagonistas de uma nova etapa da cafeicultura no Vale do Paraíba. Já na terceira etapa, foram avaliadas as condições de desenvolvimento dos plantios, coletadas amostras para análise de solo e verificada a disponibilidade de água para períodos de estiagem. A partir desse diagnóstico, foram elaborados projetos individuais de manutenção e investimento, que definiram as prioridades de cada unidade. Foram entregues caixas d’água, sistemas de irrigação, mudas e insumos. Em cada localidade, o projeto buscou soluções adaptadas à realidade dos produtores.
“Ainda faltam alguns ajustes, como mais uma adubação e a abertura de luz em pontos de sombra, mas isso é detalhe. No mais, está ótimo!”, relata Carmem. A implantação da irrigação, associada aos consórcios com frutíferas e árvores de serviço, plantadas para cumprir funções ecológicas e econômicas benéficas ao sistema, ampliou não apenas a produtividade do café, mas também a segurança alimentar das famílias.
Além dos equipamentos e insumos, cada agricultor recebeu documentos técnicos com registros detalhados, análises de solo, descrição dos sistemas instalados e orientações de manejo, que servirão de referência para o futuro, permitindo que os agricultores se apropriem dos conhecimentos compartilhados e ampliem sua autonomia na gestão dos plantios. O próximo desafio é fortalecer o associativismo, com compras conjuntas, acesso a crédito, beneficiamento e logística integrada.
A meta é estruturar um circuito produtivo sustentável de café agroflorestal na região. Ao promover mutirões entre vizinhas, Carmem e suas companheiras já sonham juntas com uma nova fase, que inclui a construção de um galpão, a aquisição de máquinas de secagem e o avanço na torra coletiva. “O mais bonito é que somos mulheres trabalhando junto para o mesmo objetivo. Isso é muito especial para nós”, ressalta Carmem. “O café agroflorestal mostra que é possível restaurar o território e, ao mesmo tempo, fortalecer a agricultura familiar, gerando renda, inclusão e comunidades mais resilientes com protagonismo feminino”, ressalta Daniella Rabello, Diretora de Programas e Articulação Territorial do Instituto Regenera.