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Os Segredos da Sobrevivência dos “Super Recifes de Corais”

Por Sarah Wakefield Adhya

A split view of above and under water, showing sky and clouds above and a coral reef below the water's surface.
UNDERWATER CORAL GARDEN Resilient coral reefs in the shallow waters of Palau, Micronesia. © Enric Sala/National Geographic Pristine Seas
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Enquanto recifes de corais de todo o mundo estão sendo devastados em níveis assombrosos por ondas de calor, os peritos da The Nature Conservancy, Instituto Oceanográfico Woods Hole e Universidade de Stanford estão se apressando para encontrar e proteger suas espécies mais resilientes.

A diminuição dos recifes de corais continua em destaque no noticiário. Corais são muito sensíveis às mudanças de temperatura, composição química e níveis de sedimentos da água. À medida que o oceano aquece, ondas de calor responsáveis pelo branqueamento dos corais estão se tornando mais frequentes e mais intensas. Surpreendentemente, algumas comunidades de corais estão sobrevivendo a esse aquecimento.

Peritos da The Nature Conservancy (TNC), do Instituto Oceanográfico Woods Hole (WHOI) e da Universidade de Stanford estão liderando uma iniciativa de cooperação para descobrir os segredos daqueles que são apropriadamente chamados de “super recifes” e ajudar os recifes de corais a persistir em um mundo em aquecimento.

As atuais áreas de interesse do trabalho com super recifes incluem Havaí, Palau, Indonésia, Ilhas Marshall, Bahamas, República Dominicana e Belize
VISTA AÉREA DE PALAU Current areas of interest for super reefs work include Hawaii, Palau, Indonesia, the Marshall Islands, the Bahamas, the Dominican Republic and Belize. © Steve Lindfield

Recifes de corais são essenciais, mas estão em um declínio acelerado

Os recifes de corais vêm evoluindo ao longo de centenas de milhões de anos e a maioria dos recifes de águas rasas que existem hoje são mais antigos que as Pirâmides de Gizé. Um recife saudável é um ecossistema incrivelmente complexo.

“Ironicamente”, afirma Aldo Croquer, gerente de um programa marinho da TNC que coordena a restauração de recifes na República Dominicana, “essa complexidade decorre da simplicidade: se examinarmos um coral, ele é a coisa mais simples que poderíamos imaginar.” Organismos minúsculos, semelhantes a sacos e com tentáculos que extraem glicose de plantas microscópicas em seu interior, constroem fortalezas submersas com vida em abundância.

Os recifes, que cobrem menos de 1% da superfície do mundo, mantêm 25% de toda a vida marinha. Eles atraem turistas que impulsionam a economia das comunidades costeiras. Fornecem proteção contra a força das ondas que, caso contrário, provocariam a destruição de habitações e a erosão do litoral. Mais de 1 bilhão de pessoas em todo o mundo dependem deles para alimento, subsistência e, em alguns casos, o próprio solo no qual cultivam e vivem.

Contudo, os recifes estão em um declínio acentuado. “Em todo o mundo, já perdemos 50% dos recifes de corais”, diz a Dra. Elizabeth McLeod, líder global de recifes da TNC. “Alguns cientistas preveem que poderemos perder até 90% até 2050, a menos que sejam adotadas medidas corajosas para reduzir os impactos da mudança climática e melhorar a gestão marinha.”

BELEZA DE RECIFE DE CORAIS
BELEZA DE RECIFE DE CORAIS Norte do Mar Vermelho © Tom Shlesinger/TNC Photo Contest 2021

O que é um Super Recife de Corais?

Um super recife é uma comunidade diversificada de corais no interior de um sistema de recifes que é mais resistente ou resiliente às ondas de calor prejudiciais. Pesquisadores estão identificando onde os super recifes estão localizados e quais deles são melhores na disseminação de “filhotes” de corais para outros recifes. 

× BELEZA DE RECIFE DE CORAIS

Por que Alguns Recifes de Corais São Mais Resilientes?

Muitos fatores têm contribuído para a perda global de recifes de corais, tais como o uso de dinamite para destruir os recifes e liberar seus peixes para coleta, poluição por esgoto despejado no oceano e a sufocação de recifes por sedimentos fruto do manejo do homem para produção ou desmatamento. Porém, o aquecimento dos oceanos é uma das ameaças que avançam mais rapidamente. 

Se as temperaturas se elevarem acima da zona de conforto dos corais por muito tempo, as algas no seu interior começarão a produzir toxinas. Os corais envenenados então expelem as algas, perdendo sua coloração e sua fonte de alimento em um único evento. Os corais podem sobreviver por algum tempo com seus estoques internos de energia ou ingerindo organismos do ambiente. Mas se esses eventos de branqueamento ocorrerem com frequência excessiva, eles não conseguirão se recuperar. 

“Essas ondas de calor marinhas são o equivalente climático a uma bomba atômica”, afirma a Dra. Ann Cohen, cientista titular que lançou o Programa de Super Recifes no WHOI em 2017. “O dano pode ser repentino e extenso, causando a disseminação do branqueamento e a morte do coral de uma só vez. Contudo, temos observado diversas comunidades de corais que sobrevivem a essas ondas de calor com impacto mínimo e outras que se recuperam com notável rapidez.

Estarão esses recifes sobrevivendo a ondas de calor por causa das condições locais do oceano? Serão geneticamente mais tolerantes ao calor? Ou seria apenas sorte? A formulação dessas perguntas e a incorporação de suas respostas às iniciativas de conservação são cruciais para a melhoria do prognóstico dos recifes do mundo.

“O que estamos fazendo é realmente extraordinário”, acrescenta Cohen. “Estamos descobrindo os segredos da natureza e usando-os para ajudá-la da melhor maneira que sabemos fazer.”

Underwater view of a coral reef in the shallow waters of Palau.
RECIFE DE CORAIS RESILIENTE Aldo Croquer da TNC compara recifes de corais a cidades. “Um recife saudável é como a cidade de Nova Iorque”, comenta. “Vemos edifícios com diferentes projetos, tamanhos, formas.” Amontoados no entorno dessas estruturas coloridas existem multidões de peixes e outros organismos. © Enric Sala/National Geographic Pristine

Trabalhando Juntos na Corrida para Salvar Recifes

Estratégias tradicionais de conservação de recifes não são suficientes diante da mudança climática; um recife ecologicamente significativo, abrigado da pesca predatória e da poluição em uma área marinha protegida cuidadosamente administrada, ainda assim pode ser destruído pelo aquecimento do oceano. Um recife condenado à destruição para abrir caminho para um novo aeroporto pode, na verdade, ser um super recife resistente ao calor, cujos bilhões de “filhotes” de corais pode recuperar recifes degradados, caso seja protegido.

Portanto, um esforço direcionado e coordenado - como a parceria conjunta para os super recifes entre a TNC, WHOI e Stanford, com a participação de agentes locais de conservação e governo - é necessário para localizar e proteger os super recifes do mundo, antes que eles sejam extintos.

“Não temos uma década para corrigir isso”, acrescenta McLeod. “E precisamos somar nossas habilidades coletivas. Tempo e financiamento são finitos. Esta parceria permite-nos priorizar nossos recursos limitados aos locais que tenham a maior possibilidade de sobrevivência e apoiar governos e comunidades liderando a tarefa de salvar seus recifes.”

Em primeiro lugar, os parceiros dos super recifes de corais envolvem líderes comunitários, pesquisadores, grupos locais e governos tomando por base a rede global da TNC de projetos de recifes de corais para identificar áreas potenciais para conservação de recifes onde existam apoio e capacidade locais.

Underwater view of two divers placing young coral on metal rebars to test their resilience to heat stress.
VERIFICANDO A RESILIÊNCIA DOS CORAIS Mergulhadores colocam corais resilientes ao calor em viveiros de recuperação feitos de barras de metal para estudá-los. © Stephen Palumbi

Mergulhadores colocam corais resilientes ao calor em viveiros de recuperação feitos de barras de metal para estudá-los.

Quote: Dr. Anne Cohen

Estamos descobrindo os segredos da natureza e usando-os para ajudá-la da melhor maneira que sabemos fazer.

Cientista do Instituto Oceanográfico Woods Hole

Depois, a Dra. Cohen e a equipe do WHOI desenvolvem modelos hidrodinâmicos, tridimensionais, em escala métrica da temperatura e fluxo dos recifes para prever onde os super recifes podem estar. Usando o resultado do modelo de dados da pesquisa, a equipe avalia como os corais das áreas selecionadas responderam a ondas de calor anteriores e como se recuperaram. As áreas que foram submetidas ao calor intenso com taxas de sobrevivência mais elevadas são boas candidatas à avaliação da tolerância ao calor.

É aqui que entra o trabalho do Dr. Stephen Palumbi, geneticista marinho da Universidade de Stanford, e equipes de estudantes locais e líderes em conservação. Eles testam várias espécies de corais quanto à resistência ao calor, quantificando sua capacidade de suportar as temperaturas elevadas e futuras ondas de calor, gerando dados cruciais para a pesquisa sobre super recifes.

A equipe do WHOI então executa simulações de dispersão de larvas para medir a ligação entre locais de super recifes e outras áreas de recifes. As áreas que exibirem elevada tolerância ao calor e capacidade de semear novamente recifes nas proximidades serão priorizadas para a etapa seguinte. A Dra. McLeod trabalha com colegas da TNC e parceiros locais para validar os resultados do modelo com dados locais e apoiar a proteção e restauração dos super recifes. 

Quote: Dr. Stephen Palumbi

Nossa missão é salvar o máximo possível, de modo que, quando o mudo melhorar – e ele vai melhorar, porque isso será resolvido – então existirá algo a partir do que voltar a crescer.

Geneticista marinho da Universidade de Stanford

Democratização da Ciência para Melhorar a Pesquisa, Proteção e Restauração

A chave para a sobrevivência dos recifes não tem a ver com uma única solução para tudo. “Tem a ver com um conjunto complexo de condições ecológicas, atividades humanas e situações que se reúnem no final”, diz Palumbi. A ciência é apenas uma parte da história. A colaboração necessária para expandir seu alcance e colocar suas conclusões em prática é outra parte.

Uma importante característica do projeto de super recifes é o uso de métodos de baixo custo para identificar a resistência ao calor em corais que possam ser replicados em múltiplas regiões geográficas, aumentando, assim, o ritmo e a escala do trabalho. Aprendizados bem-sucedidos podem ser implementados por meio de redes globais de compartilhamento de conhecimentos, como a Reef Resilience Network criada pela TNC e o Programa de Conservação de Recifes de Corais da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica (NOAA na sigla em inglês), que conectam profissionais em conservação marinha de todo o mundo às mais recentes abordagens da ciência e gestão.

Em última análise, a melhor maneira de ajudar os recifes é evitar sua destruição antes de qualquer coisa. A redução das emissões dos gases do efeito estufa, a melhoria da gestão de áreas marinhas protegidas do mundo e a restauração dos recifes, são todas partes importantes da solução. A parceria relacionada aos super recifes aprimora as iniciativas de conservação dos recifes, tornando-as mais eficazes nas condições mais quentes do futuro.

“Nossa missão é salvar o máximo possível, de modo que, quando o mundo melhorar – e ele vai melhorar, porque isso será resolvido – então existirá algo a partir do que voltar a crescer,” conclui Palumbi.