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Novo Relatório da ONU sobre o Clima: “Em uma encruzilhada crítica para o clima, agora qualquer fração de grau importa"

A parte final do Sexto Relatório de Avaliação do IPCC mostra que não podemos deixar que o fatalismo retarde a aceleração da ação climática em curso.

Imagem de floresta conservada
FLORESTA EM PÉ Floresta no Parque Nacional do Pau Brasil, na Bahia, que faz parte dos 7% de remanscentes da vegetacão nativa da Mata Atlântica no Brasil. © Adriano Gambarini

Hoje o Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC, na sigla em inglês) das Nações Unidas publicou seu mais recente relatório sobre o clima, com as constatações científicas que passaram por revisão de pares de mais de 195 países sobre megatendências climáticas, seus efeitos e soluções. Tomando por base os três relatórios anteriores dessa série, a evidência é clara: embora haja uma crescente mobilização política, empresarial e social, o cenário ainda é negativo, a menos que o mundo acelere com urgência os esforços para enfrentar a crise climática.

Ao comentar o conteúdo desse relatório, a CEO da The Nature Conservancy, Jennifer Morris, disse:

“Embora o tom deste relatório não surpreenda ninguém que esteja familiarizado com os três anteriores, o alerta é coerente: está ocorrendo um progresso lento, mas ele ainda representa apenas uma gota no oceano, em comparação com o tamanho da emergência.

Para garantir o futuro que as próximas gerações merecem, com sistemas alimentares resilientes, recursos abundantes de água, bem-estar humano e conservação da biodiversidade, os líderes globais precisam ir muito mais além e mais rápido na redução das emissões, ao mesmo tempo em que aumentam a capacidade das comunidades e das empresas em adaptar-se aos efeitos da mudança climática.

O debate que se seguiu a esse relatório concentrou-se em saber se ainda é realista a meta do Acordo de Paris em manter a elevação da temperatura média global bem abaixo dos 2°C acima dos níveis pré-industriais e, ao mesmo tempo, empreender esforços para limitar esse aumento em até 1,5°C. Infelizmente, o relatório projeta que as atuais políticas climáticas tornam o aumento de 2°C extremamente provável neste século e que poderemos até alcançar a barreira dos 3°C até o ano de 2100. Não podemos ficar parados e permitir que este cenário ocorra.

Esse relatório ressalta o fato de que ingressamos em uma era na qual nossas perspectivas não podem mais ser quantificadas de forma conveniente, reconhecendo avanços incrementais de 0,5°C. Nesse momento, qualquer fração de grau de aquecimento que possamos evitar contribuirá para um futuro menos perigoso e caro. A boa notícia é que sabemos o que precisamos fazer e o mundo está começando a investir na natureza, a fazer a transição para fontes de energia renováveis, a inovar em todos os setores da indústria e a reconhecer cada vez mais a importância do conhecimento dos Povos Indígenas. Porém, precisamos de mais ação e com maior rapidez.

O preenchimento da lacuna entre a ambição prevista no Acordo de Paris e a real implementação de soluções climáticas exigirá novas políticas e programas em maior escala, além da garantia de mais fluxos de financiamento público e privado para a ação climática – custos de curto prazo que são insignificantes diante dos benefícios de longo prazo.

É fácil perder a esperança quando um relatório após o outro ressalta essas consequências catastróficas, entretanto, vejo que é possível alcançar um futuro melhor. Há indicadores que nos animam: nos últimos dez anos, o custo dos recursos renováveis despencou, ao passo que sua eficiência aumentou significativamente e a conscientização e valorização do potencial de contribuição da natureza para o clima vêm crescendo continuamente.

Podemos aproveitar este momento de cinco maneiras: 1)  Elevando novas vozes que atualmente não participam da tomada de decisão e assegurando que as soluções climáticas sejam igualitárias, justas e inclusivas; 2)  Descarbonizando rapidamente os setores de energia e transporte; 3) Acelerando a redução dos gases do efeito estufa que já existem na atmosfera por meio da proteção das florestas,  da restauração e de outras soluções climáticas naturais, incluindo recuperação de manguezais e a agricultura regenerativa em ampla escala; 4) Intensificando urgentemente os esforços de adaptação, equipando nossos sistemas, comunidades e infraestrutura com a durabilidade necessária para um futuro imprevisível; e 5) Aproveitando a nova Convenção das Nações Unidas sobre Diversidade Biológica e o recente Tratado do Alto-Mar para combater a perda de biodiversidade e continuar  a desenvolver e inserir no mercado mecanismos de financiamento inovadores, capazes de atrair o investimento necessário para intensificar esses esforços.

A mudança climática não é uma escolha na qual os seres humanos ainda controlam o botão de liga/desliga. Décadas de inação e desinformação diante das evidências científicas deixaram o botão fixado na posição ativada e qualquer prevaricação terá consequências.

Não é hora para falso otimismo, nem podemos permitir que o fatalismo protele nosso progresso na ação climática global. É essencial que busquemos a adaptação e a mitigação com igual vigor, particularmente para as populações de renda mais baixa e economias em desenvolvimento, grupos que frequentemente são os mais expostos aos impactos provocados pelo clima, apesar de terem sido aqueles que menos contribuíram para os problemas que estão enfrentando.

No momento em que nos encontramos à beira de uma mudança potencialmente irreversível, este relatório ressalta a importância vital de acelerar nossos esforços relacionados ao clima enquanto ainda há tempo.